Acordei, mas teimei em
não abrir os olhos. Tentei, por alguns instantes, voltar para aquele
lugar, queria saber como tinha terminado aquela história escrita com
suor e sofrimento.
Marcos Rocha lançava o
lateral para Ronaldinho, segundos antes fingindo beber água, e
tocava no meio para Jô (terror do tricolor) empurrar para dentro do
gol do São Paulo. Aquela vez foram dois, Réver marcou para o Galo
no segundo tempo. Se eles soubessem que três meses depois seriam
massacrados mais uma vez, no Horto, teriam comemorado aquela derrota
por 2x1 e a noite “pouco inspirada” do artilheiro atleticano.
O segundo capítulo foi
na Argentina, pobre Arsenal, massacrado pelo garoto Bernard. Três
gols na conta do menino para a tabela de artilharia e cinco nas
costas do time azul só aquele dia. Depois eles ainda viriam em BH
para brigarem com a polícia e saírem mais uma vez humilhados, com
show do melhor jogador do planeta e mais cinco no lombo.
“Os mais fortes”
também cruzaram o caminho alvinegro. No Horto, apesar do 2x1,
vencemos sem sustos. Em seguida subimos o morro de La Paz procurando
o caminhos do céu, da classificação garantida para a fase
seguinte. De inicio, não sabíamos que aquele jogo nos reservaria a
primeira vitória épica. O que faltou de oxigênio, no ar rarefeito
da Bolívia, sobrou em raça. Aos 83 minutos de jogo, um cara que não
chegou ao ápice do sonho, Serginho, cruzou da direita e o zagueirão
apavorado empurrou para as redes. 2x1 sem fôlego, mas com a
classificação garantida para as oitavas como melhor time da fase
inicial.
Depois fomos ao Morumbi
enfrentar o São Paulo, jogo que não valia nada e só serviu para o
time paulista achar que podia com o Galo. Doce ilusão, tricolor,
doce ilusão...
“Quando tá valendo,
tá valendo!” e quando valia nós vencemos, no agregado, por 6x2.
No Morumbi foi 2x1, em BH o espetáculo foi maior, 4x1, com show do
artilheiro das Américas. Adiciona três para o Jô. A partir dali todo Brasil se rendeu ao melhor time das Américas, encantados pelos encantadores.
A partir das quartas de
final o destino reservou para o atleticano, o desfibrilador. Fomos a
Tijuana, enfrentar “Los Xolos”. Foram mais fortes que
esperávamos, a grama sintética jogava a favor dos mexicanos, que abriram 2x0 e jogavam melhor. Mas ali começava a sequência
interminável de momentos épicos. Luan, aos 46 minutos do segundo tempo empatou para o Atlético,
a vantagem era alvinegra.
No Horto, o pânico foi anunciado
antecipadamente. Aquelas máscaras agourentas e o pênalti marcado a
favor dos mexicanos aos 46 do segundo tempo transformavam nosso sonho
de conquistar a América em pesadelo. Por alguns instantes, minha
vontade era acordar do sonho, desistir de acompanhar o que estava por
vir. Riacos estava frente a frente com Victor, 11 metros era o que
separava o Galo da eliminação. A escolha do sobrenatural foi a
nosso favor, canonizado pelo pé esquerdo, Victor se tornava santo e
aquelas máscaras nunca mais ousariam entrar no Horto. Faltavam 4.
A partir dali mais que
nunca eu queria mergulhar profundamente naquele sonho. Agora era a
vez do Newell's, os argentinos viriam com Scocco, Maxi Rodriguez e um
estádio lotado. Justamente os dois destaques do time argentino
marcaram na partida em que muitos diziam que transformaria, mais uma
vez, nosso sonho em pesadelo. Naquele momento, precisávamos buscar
forças, lembrar de 2012 e suas viradas épicas sobre Botafogo,
Figueirense, Sport, Cruzeiro e Fluminense. Não era apenas
reminiscência, era a prova que poderíamos virar o jogo e continuar
sonhando. A canonização de Victor não poderia ser por acaso, se há
um Deus no futebol, ele não deixaria que tudo se perdesse naquele
momento.
E assim foi, mais uma vez, o Independência ferveu. O
primeiro herói era Ronaldinho que com passe magistral encontrou
Bernard, candidato à vilão pelo gol perdido na Argentina, e desta
vez o garoto chutou a bola e toda desconfiança que existia para a
rede dos argentinos atrevidos. Galo 1x0 ainda aos 2 minutos de jogo. A partida
seguia e cada volta do ponteiro se tornava mais curta. Minutos
pareciam segundos, o tempo era inimigo de um time que demonstrava
desorganização. Ainda faltava pelo menos um gol para levar a
decisão para as mãos, ou pés, do santo Atleticano. As luzes do Independência
se apagavam, para acender a esperança de cada um dos milhões de
atleticano naquele instante. Enquanto a bola não rolava, mais uma
vez lembrávamos de tudo que passamos para chegar até ali, não
poderia acordar daquele jeito, estava na hora de sermos mais
Alvinegros do que nunca, desistir naquele momento não estava no pensamento.
Cuca aproveitou para
colocar Guilherme e Alecsandro em campo. Duvido que alguém tenha
comemorado a entrada do ex-vilão que poucos toque na bola depois se
tornaria um dos heróis do jogo mais importante da história do
Atlético até aquele dia. O chute foi forte, no canto, aos 39 minuto
do segundo tempo. Depois daquilo não tinha como duvidar que o Deus
do futebol estava vestindo preto e branco e levava o número 17 às
costas. Os 11 metros que levaram Victor à gloria contra o Tijuana
ameaçavam jogar Jô e Richarlyson no inferno. Por incompetência
argentina, ou por competência divina, dois deles erraram também.
Naquele momento, era possível ver ateu rezando o terço.
Ronaldinho tinha a chance de jogar a pressão para Maxi Rodriguez e o
fez. Mais uma vez, o destino pôs Victor separado, por 11 metros, da
glória. Comemorem! Chegamos a final!
E como é o destino...
mais uma vez disputaríamos uma competição continental com o
Olimpia. As recordações eram as melhores possíveis, o velho Negrini que o
diga. Com o resultado no Denfesores del Chaco, mais uma vez fomos
obrigados a ter que buscar na memória motivos para a acreditar.
Desta feita fomos mais longe, lembramos não somente as vitórias de
virada, ou defesas de Victor. Tudo veio à memória, todo sofrimento
que passamos para chegar até aqui, Pierre jogando com a cabeça
rachada, Leo Silva jogando no sacrifício. Depois de lutarmos contra
tantas tempestades, estávamos a apenas 3 gols, talvez 2, de colocar
o nome de Victor, Lee, Giovanni, Michel, Marcos Rocha, Carlos César,
Réver, Gilberto, Rafael, Leonardo, Júnior, Richarlyson, Pierre,
Josué, Donizete, Rosinei, Ronaldo, Bernard, Guilherme, Luan, Diego,
Alecsandro, Jô, Cuca e Kalil na história da América como o melhor time
do Galo de todos os tempos.
Desta vez não teríamos
o Horto, mas o Mineirão, nossa eterna casa. Como não poderia ser diferente, estava lotado. Precisávamos de apenas 3 gols, talvez 2, para levar a taça para a sala de
troféus Vilibaldo Alves no Lourdes. Não cogitávamos outro final,
após seguidos sofrimentos, o desfibrilador estaria funcionando novamente, aquela seria uma noite diferente de todas as outras, o dia
amanheceria monocromático, sem qualquer tom de azul.
Era a hora de
acreditarmos na camisa da sorte, em destino. Era a hora de todo
atleticano junto depositar sua fé, seja ela em que fosse, nos
jogadores. Não tinha como ser diferente, agora era a nossa hora. BH teria que virar um inferno. Nem que fosse, ironicamente, com ajuda divina. Afinal, o que custa dizer "Amém"?
Desfibriladores a postos? - mesmo que não, eu não importaria de morrer ali. O juiz apitou e rolou a
bola...
NÃO ACORDEM, MASSA!
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